quinta-feira, 24 de junho de 2010

Mind the Gap - A Londres de Um Lugar Chamado Nothing Hill


Um Lugar Chamado Notting Hill (Notting Hill)


Um ótimo romance, com bastante humor inglês – cortesia do amigo do personagem de Grant, com quem divide um apartamento – e sentimentalismo americano, que não chega a atrapalhar o andamento do filme. Julia Roberts parece estar interpretando a si mesma, e Grant surge mais uma vez como um inglês bobalhão e desajeitado, bem ao estilo Quatro Casamentos e um Funeral, Nove Meses e Um Grande Garoto. Nada de novidade, e sem a força de um Uma Linda Mulher, mas ainda assim bastante divertido e convincente, garantindo boas risadas e situações embaraçantes.


O roteiro passeia – e romatiza – o bairro londrino que dá nome ao filme. Notthing Hill, região centro-oeste da cidade, aparece como uma charmosa e pitoresca vila inglesa, o que de fato ela é. Mas nem sempre foi assim. Notting Hill tem muita história, e merece destaque em nossa viagem. Veja mais adiante.

A famosa livraria do personagem de Hugh Grant, a Travel Book Company, infelizmente não existe. A sua fachada foi forjada no número 142 da Portobello Road, onde hoje fica a loja de móveis Gong. A produção utilizou o interior de outra livraria, a Travel Bookshop, que fica nos números 13-15 da Blenheim Crescent, virando a esquina da Portobello Road. Ali perto também fica (ou ficava) a porta azul que representava a entrada do flat do personagem de Grant. Bom, o flat, obviamente, continua lá. A porta, no entanto, não é mais a mesma. Após o sucesso do filme, o local virou atração turística do bairro. O proprietário, no intuito de acabar com a constante presença de turistas batendo a sua porta – exatamente como os papparazzis faziam no filme – resolveu então trocá-la, leiloando a mesma e revertendo seu lucro a instituições de caridade. A porta agora é preta, mas o endereço ainda é o mesmo, número 280 da Westbourne Park Road. Partindo deste endereço, pegando a Kensington Park Road 300 metros em direção ao sul, chegamos a Lansdowne Road, onde ficava a casa da irmã de Hugh Grant no filme, e onde ocorre um jantar de aniversário hilariante. O endereço exato é o número 91 desta rua. Virando a próxima esquina, temos a rua onde fica a entrada de um jardim particular, e que aparece em outra cena bastante engraçada, onde o personagem de Grant tenta pular o muro que separa o jardim da rua. Trata-se do Rosmead Gardens, na Rosmead Road.


Dicas para reabastecer suas energias: se quiser algo mais sério, chique e representativo financeiramente falando, vá jantar no Nobu, restaurante japonês freqüentado pelo casal principal do filme. Ele fica no Metropolitan Hotel, número 10 da Old Park Lane, perto da extremidade leste do imenso Hyde Park. Ou se preferir algo mais simbólico, por assim dizer, dê uma paradinha no Coffee Republic. Uma de suas lojas fica em Notting Hill mesmo, na esquina da Westbourne Park com a Portobello Road. Na calçada deste exato local, o persogem de Grant esbarra – literalmente – pela primeira vez com a diva Julia Roberts. No filme, o imóvel em questão ainda estava vazio.

Para terminar o passeio por Notting Hill (o filme, não o bairro), dê uma passadinha no cinema onde Grant vê o filme Helix (fictício, claro), estrelado por Julia Roberts, que fica no número 103 da Notting Hill Gate, e se chama Coronet Cinema. E se sobrar tempo, aproveite para conhecer o lindo jardim – da incrível mansão – onde estava sendo filmada uma cena de um novo filme de Roberts, motivo pelo qual a atriz estava na cidade. Trata-se da Kenwood House, na Hampstead Lane, ao norte de Londres. Este antigo casarão guarda obras de arte da antiguidade e tem sua entrada aberta a visitação pública. E o melhor, assim como todos os museus da cidade, sua entrada é gratuita.


Making off:
- Hugh Grant e o diretor Roger Mitchell já haviam trabalhado juntos anteriormente, em Quatro Casamentos e um Funeral;
- No filme, Anna Scott diz que recebeu 15 milhões de dólares pelo seu último papel nocinema. Foi exatamente esta a quantia recebida por Julia Roberts para estrelar Um Lugar Chamado Notting Hill;
- Indicado ao Globo de Ouro nas categorias de Melhor Filme - Comédia / Musical, Melhor Ator de Cinema - Comédia / Musical (Hugh Grant) e Melhor Atriz de Cinema - Comédia / Música (Julia Roberts).


Bônus:

Notting Hill, o bairro.

Da área rural, típica do início do século XIX, à Notting Hill atual, com suas casas em estilo vitoriano, ruas arborizadas, parques floridos, feiras semanais e festivais culturais anuais (Notting Hill Carnival), muitas mudanças foram necessárias. Durante a segunda Grande Guerra (sempre ela), o bairro – além de muitas outras cidades inglesas – teve algumas de suas construções abaladas pela famosa Blitz Alemã, um bombardeio contínuo pela Luftwaffe durante setembro de 1940 e maio de 1941. Uma delas, a All Saints Church, foi bombardeada em duas oportunidades, em 41 e 44, e precisou ser restaurada quase por completo.
No anos seguintes ao fim da Guerra, Notting Hill sofreu uma intensa imigração Caribenha, que ocupava sem nenhum critério imensos casarões vitorianos, transformados em verdadeiros pardieiros. Na déca de 50, surgiu um grupo que ficou conhecido como Teddy Boys, que compreendia trabalhadores de classe média, brancos e muitos deles bastante jovens. Seu objetivo era hostilizar as famílias negras que viviam na região, através de atos de vandalismo e violência física, como a sofrida por um casal numa estação de metro da cidade. Em agosto deste ano, uma gangue de jovens brancos atacou verbalmente a sueca Majbritt Morrison e seu marido jamaicano. Na noite seguinte, o casal sofreu severas agressões físicas, dando início ao motin racial de Notting Hill, ou Notting Hill race riots, que durou várias noites, só terminando dia 5 de setembro, com a prisão de mais de 140 pessoas.
Em janeiro de 1959, com o objetivo de acalmar a tensão racial que existia não só no bairro, como em toda Londres, surgia o Notting Hill Carnival, pelas mãos de Claudia Jones, uma moradora da região, originária de Trinidad Tobago. Até 1965, o festival, apesar do relativo sucesso, ainda era organizado em clubes da região. Em 1966, foi levado para as ruas, e seu sucesso só veio a aumentar. Capitaneado principalmente por Caribenhos, o carnaval londrino de Notting Hill se assemelha (com suas devidas proporções) ao carnaval carioca (Brasil), e reúne hoje cerca de 500 mil pessoas anualmente, nos meses de agosto, durante apenas 2 dias de festa. Nada mal para um povo clássico, que se orgulha de sua pontualidade e de sua tradicional pausa para o chá das cinco.
Durante as décadas seguintes, principalmente nos anos 70 e 80, toda a região de Notting Hill foi remodelada e reestruturada até se converter no bairro chique que conhecemos hoje. E além do Notting Hill Carnival, o bairro ainda ostenta uma famosa feira de antiguidades, a Portobello Road Market, que acontece todos os sábados na rua de mesmo nome, e que inclusive aparece em uma cena do filme. Durante alguns dias da semana, esta mesma feira, nesta mesma rua, transforma-se num verdadeiro mercado de frutas e vegetais ao ar livre. Agora sim, uma feira de antiguidades tem muito mais a ver com Londres do que um carnaval de rua. Sem preconceito, claro.

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