quinta-feira, 24 de junho de 2010

Paris de Julie


2 Dias em Paris (2 Days in Paris)


Delicioso. Esta é a melhor definição para 2 Dias em Paris. Uma comédia romântica moderna, por assim dizer, que tem muito mais a oferecer que apenas uma hora e meia de algumas risadas e um final feliz. Sim, tem um final feliz, mas bastante realista e tocante. Difícil não se identificar com o texto de Delpy, direto e ao mesmo tempo profundo, como são as relação no mundo real. Dúvidas, inseguranças e insatisfações dividem espaço com festas, viagens e trabalho. Tudo muito sóbrio, e ao mesmo tempo poético. Cômico também, seja pelas situações enfrentadas pelo namorado, que não entende nada de francês, seja pela descrição do povo parisiense através de seus motoristas de taxi. Um dá em cima de Delpy mesmo na presença do namorado. Outro prega a violência familiar, e um terceiro, que se envolve numa discussão calorosa com a personagem de Delpy, é racista e preconceituoso. Mas toda essa crítica aos ideais e costumes franceses é rapidamente atenuada quando se observa o comportamento americano em solo francês, principalmente através do personagem de Goldberg, que discrimina turistas americanos que vão a Paris para fazer o “tour Còdigo da Vinci”, ao mesmo tempo que esnoba detalhes e características da cidade, mas faz questão de visitar o túmulo de Jim Morisson, sem mesmo apreciar o The Doors. O filme é assim, bate e apanha ao mesmo tempo. Cortesia, mais uma vez, do texto enxuto de Julie Delpy, que ainda dirigiu e atuou no filme. Original e divertidíssimo.


As locações são obrigatórias. Mesmo as mais mórbidas, como o túmulo de Jim Morrison, que morreu aos 27 anos de idade, em Paris, e foi enterrado no cemitério de Montparnasse, o Pére-Lachaise; e as famosas Catacumbas de Paris, um local fantástico, com pilhas e mais pilhas de ossos humanos espalhados por corredores subterrâneos conhecidos como Lês Carrieres de Paris, de onde foi retirada a maioria das pedras utilizadas na construção das pontes que cruzam o Sena. O casal faz uma breve parada na Pont Bir-Hakeim, a mesma do filme O Último Tango em Paris, e depois pode ser visto numa estação de metro, a Pasteur, que serve as linhas 6 e 12, no XV arrondissement. Você pode descer nesta estação para conhecer a Tour Montparnasse, um edifício de escritórios com 59 andares. O prédio em si é odiado pelos parisienses, por ser um bloco de concreto e vidro escuro que nada tem haver com a arquitetura da cidade. Mas do alto de seus 210 metros temos uma visão ímpar da cidade. Aliás, a única visão tão alta quanto a visão que temos da Torre Eiffel, mas com a vantagem de termos a Torre Eiffel emoldurando o cenário. Imperdível.
Após algumas corridas de Taxi bastante peculiares, acompanhamos o casal num almoço (ou na tentativa de almoçar) num restaurante (não identificado) à beira do Canal St. Martin. Como já foi comentado, passear pelas marges do Canal St. Martin, aos domingos, e apreciar um bom café numa de suas típicas brasseries, é um dos melhores programas para se fazer na cidade Luz. Você vai se sentir como um verdadeiro cidadão de parisiense. Uh lá lá...


Making off
- As filmagens de 2 Dias em Paris consumiram, na verdade, 25 dias, e ocorreram entre 19 de junho e 14 de julho de 2006;
- Julie Delpy já dirigiu 3 filmes. Este 2 Dias em Paris, Looking for Jimmy (sem título em português) e a Condessa.


Bônus

Por que visitar uma pilha de ossos no sub-solo de Paris?

Aproximadamente 400 quilômetros. Esta é a extensão de Lês Carrieres de Paris, ou os subterrâneos de Paris, um sistema de túneis escavados há cerca de 20 metros de profundidade, nas entranhas da cidade Luz. A escavação não tinha como objetivo guardar os ossos dos mortos da cidade. Esse detalhe veio bem depois, no ano de 1785. Os túneis foram escavados apenas para fornecer a matéria-prima para acostrução de boa parte das lindas pontes que cruzam o Sena. Isso mesmo, todas as pedras, lindamente lapidadas e arrumadas nas famosas pontes de Paris, vieram do sub-solo da cidade. Por isso essa imensidão de túneis. Muitas pedras rolaram.
As Catacumbas foram criadas depois, por simples necessidade básica. Higiene mesmo. Em meados do século XVIII, a maiorias das (muitas) igrejas de Paris tinha seu próprio cemitério. Com o crescimento vertiginoso da cidade, nenhum destes locais tinha mais espaço para novos “moradores”. Muitas pessoas, que habitavam os arredores destes cemitérios, estavam adoecendo devido a contaminação de água e solo com matéria orgânica em decomposição. A situação era assustadora.
Em 1785, o Conselho de Estado resolveu tomar uma atitude. Novos cemitérios, bem longe do centro da cidade, já estavam sendo construídos. Mas o que fazer com as ossadas que permaneciam nos cemitérios antigos, superlotados e super-contaminados? A idéia veio do chefe de polícia, General Alexandre Lenoir: por que não utilizar os corredores subterrâneos da cidade? E assim foi feito. Sob orientação de Charles Axel Guillaumont, Inspetor Geral dos túneis de Paris, as primeiras ossadas transferidas saíram do cemitério Saint-Nicolas-des-Champs após as catacumbas terem sido abençoadas, em 4 de abril de
1786. Inicialmente, as ossadas eram jogadas de qualquer jeito. Só a partir de 1800, no Império Francês, que as ossadas foram sendo organizadas de uma maneira mais “criativa”, por assim dizer: fêmur e tíbia (ossos longos) afrente, para formar uma parede que foi decorada com crânios e demais “peças” do esqueleto humano. Uma verdadeira obra de arte, composta por cerca de 5 milhões de pessoas. Tão assustador quanto intrigante.

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