quinta-feira, 24 de junho de 2010

Paris - O Código DaVinci


O Código Da Vinci (The Da Vinci Code)

O Código Da Vinci, o filme, pode ser interpretado através de duas visões distintas: a primeira, dos leitores da obra homônima de Dan Brown. A segunda, por quem nunca chegou perto do livro (coisa rara). Invariavelmente, para leitores e leigos, trata-se de uma história tão absurda quanto o profético fim do mundo em 2012, proposto pelo calendário Maia. Ou seja, tudo muito bem amarrado, mas que não passa de idéias – ou no máximo suposições – vindas de mentes muito criativas. Não que eu seja um católico fervoroso que defende a unhas e dentes a história de Jesus Cristo e Maria Madalena. Muito pelo contrário. Mas por menos religioso que eu possa ser, acreditar na versão de Dan Brown, conspiratória ao extremo, é engolir a seco que uma mentira possa ter sido escondida por tanto tempo e por tantas pessoas, igreja envolvida ou não. Um pouco demais para humanos apenas.


Agora, quando analisamos o filme numa comparação direta com o best-seller de 2003, com mais de 70 milhões de cópias vendidas mundo afora, novas considerações devem ser feitas. Primeira, e mais óbvia: quem leu o livro de Dan Brown, não gostou do filme de Ron Howard. E o inverso também vale: quem não leu o livro, gostou do filme. Segunda consideração, que bate de frente com a primeira: independente de gostar ou não da versão cinematográfica, o público lotou os cinemas, rendendo ao estúdio algo em torno de U$ 800 milhões. Ou seja, fidelidadade ou não, o que vale é o quanto o filme empolga. E nesse quesito, críticos de plantão que me perdoem, mas O Código da Vinci está bem acima da média. Que o filme de Ron Howard tem suas falhas, seus clichês e seus exageros, todos sabemos. Mas oras, o que podemos dizer do livro, se não a mesma coisa? O filme diverte, entretém e até faz pensar, tudo na medida. Tem coadjuvantes interessantes, como Tautou e Reno, e um enredo de fazer inveja a qualquer roteirista hollywoodiano. E como se não bastasse, o filme ainda nos leva a grandes locações nas cidades de Paris e Londres. Então, se prestarmos atenção a ingênua história do simbologista Robert Langdom, mergulhado numa trama ultra-secreta envolvendo a igreja e grandes pensadores, poderemos ver que tudo não passa de uma deliciosa aventura, uma matine de primeira, bem ao velho e bom estilo Indiana Jones. E é assim que o filme deve ser avaliado. Ao invés de criticar a suposta direção acadêmica de Ron Howard ou o tão comentado corte de cabelo estilo “mullets” do personagem de Tom Hanks, sente-se na poltrona e deixe-se levar por uma aventura bem acima da média.


Louvre, St. Sulpice, Gare Du Nord e Bois de Boulogne. Todos atrativos turísticos da cidade de Paris, que volta e meia, desfilam pela história. Este último, Bois de Boulogne, talvez não tenha uma veia tão turística assim. Mas serve como curiosidade, pois foi neste parque, quase três vezes maior que o Central Park de NY, que Santos Dumont executou diversas experiências aéreas antes de realmente decolar com seu XIV Bis, no início do século XX. A Igreja de St. Sulpice, do filme, só reflete o exterior da verdadeira Igreja de St. Sulpice.


O interior foi filmado em estúdio, com uma ajudinha de um bocado de efeitos especiais. Assim como o Museu do Louvre, que aparece freqüentemente, seja através de seus imensos corredores ou com as famosas pirâmides de vidro, na entrada ou no interior.


Esta última, invertida. Muito deste interior teve que ser recriado em estúdio, principalmente a cena da Mona Lisa, protegida a sete chaves pelo Museu. Algumas outras cenas foram de fato filmadas no Louvre, o que não é uma novidade, por assim dizer, pois filmes como Os Sonhadores (The Dreamers) de Bernardo Bertolucci e Época da Inocência (Age of Innocence), de Martin Scorsese, já tiveram cenas rodadas dentro deste gigantesco museu.
No entanto, a locação que desperta maior curiosidade quando seguimos os passos (literalmente) de Robert Langdon em Paris, é a famosa Rose Line, que é citada em determinado momento dentro da igreja de St. Sulpice, e mais tarde, bem ao final, após um insight do personagem, quando Langdon chega novamente ao Louvre, seguindo esta famosa linha. Ela existe mesmo? Se existe, para que serve? E o que são aquelas “medalhas” gigantes encravadas no piso? Bom, vamos elucidar o caso. Sim, ela existe mesmo, mas tem o nome de Meridiano de Paris, e não tem qualquer ligação com seitas esotéricas. Isso mesmo, a linha representa um meridiano criado pelo astrônomo francês Abbé Jean Picard, por volta de 1670.


Mais de cem anos depois, em 1800, outro astrônomo, François Arago, recalculou com maior precisão a localização exata do meridiano que deveria representar a longitude zero do globo terrestre. Mas nem todo o mundo aceitou o meridiano de Paris como definitivo. Como na época a tecnologia de GPS não existia, muito menos a internet, muitos outros meridianos dividiam as atenções com a linha de Paris. Em Portugal, foi adotado o meridiano de Coimbra ou de Lisboa, na Espanha, o meridiano de Cádis, e na Holanda, o meridiano do Pico de Tenerife. E estes são apenas alguns exemplos. Mas após um acordo internacional (produto da Conferência Internacional do Meridiano, que aconteceu em Washington DC, em 1884), ficou definido que o meridiano de Greenwich – que passa pela cidade de Greenwich, na Inglatera – seria adotado como o primeiro meridiano, servindo como referência para calcular as distâncias em longitudes e estabelecer os fusos horários em todas as regiões do globo. A França não aceitou muito bem esta decisão, continuando a utilizar o meridiano de Paris como base, até o início do século XX, por volta de 1910. Este meridiano foi um grande “rival” do meridiano de Greenwich por muito tempo. E esta rivalidade pode ser encontrada inclusive no livre de Julio Verne, “As Vinte Mil Léguas Submarinas”.

Os medalhões incravados no chão de Paris, nada mais são que uma homenagem – um memorial – a astrônomo François Arago, criado pelo artista holandês Jan Dibbets a pedido da associação Arago, de Paris. São 135 (ou 121, há controvérsias) medalhas de bronze com a inscrição Arago e as letras N e S (Norte e Sul), na linha do meridiano que corta acidade de norte a sul por cerca de 9 quilômetros. No Observatório de Paris (l'Observatoire de Paris), também é possível ver essa linha no chão de uma de suas salas. Assim como na cidade de Greenwich (Inglaterra), em seu Real Observatório, onde é possível ver o traçado original do Meridiano de Greenwich. Para o desgosto dos franceses.

Mas um detalhe: a linha que corta o interior da igreja de St. Sulpice não tem relação alguma com o meridiano de Paris. Este tem seu traçado distante cerca de 100 metros da igreja. Esta linha, dentro da St. Súplice, assim como o obelisco de mármore (“gnomon”) que fica numa das extremidades desta linha, foi uma encomenda feita pela própria igreja, com o objetivo de marcar com exatidão a época da páscoa cristã. Como? Simples. Existe uma linha dourada que se inicia na ponta do obelisco e se extende através do chão da igreja, até desaparecer numa capela lateral. No final desta linha, olhando para cima, no imenso vitral, é possível ver que numa das janelas o vidro foi trocado por uma placa escura. Esta placa é que constitui o verdadeiro gnomon (anteparo que permite o estudo da movimentação do sol), e não o obelisco de mármore, que serve apenas para dar continuidade a linha do chão e demarcar, portanto, o solstício de inverno. A linha se extende de norte a sul, e a sombra que o verdadeiro obelisco faz no chão, quando parar bem em frente ao altar principal, é que vai indicar o equinócio da primavera, no dia 21 de março de cada ano. A data da páscoa é definida como o domingo que segue a primeira lua cheia após o equinócio de primavera, no hemisfério norte. Esta linha, portanto, é apenas um calendário solar, e nada tem haver com a Rose Line, ou a Rosslyn, ou o meridiano de Paris ou mesmo o tão falado Priorado de Sião. Dan Brown apenas aliou livremente, sem compromisso com a verdade, um excelente trabalho de pesquisa a uma história polêmica envolvendo Jesus Cristo, Maria Madalena e Leonardo Da Vinci. Palmas para o autor.


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